quarta-feira, junho 14, 2006

e já que estão valendo os devaneios...

o bar de sempre, cara de (precoce) fim de festa às 8 da noite. mas cheio. samba, muito álcool, catarse coletiva chamada copa do mundo. eu, moleque: futebol, samba, cachaça, amigos, maconha e enquadro da polícia, que encarei sozinha, que nem macho - só faltava estar fedendo a suor. e ele chegou. ele, que eu não gosto mais. ele, que acho bobo, infantil, feio, desnecessário: passado. ele, que apesar de tudo isso ainda balança meu coração (seja por desejo, seja por irritação) com o olhar insistente e enigmático, e que me faz - agora, que não mais me mete medo - responder com olhar de quem diz "que que é maluco? fala que eu te escuto! olhar assim não adianta, que não entendo seus melindres". resposta que não tem tréplica: só o mesmo olhar que faz até minhas amigas corarem diante de tal insistência de olhos e ouvidos que prestam atenção às nossas conversas.

mais uma vez não passou disso. mas vou contar a história do que poderia ter sido. como toda a nossa história é a história do amor que poderia ter sido.

ele poderia ter chegado três minutos antes, a tempo de me ver ainda levando sermão dos policiais inexperientes, com blazer preto e muita lábia - "jeito de mafiosa", alguém comentou. então podia ter parado na calçada e assistido, procupada e atentamente, o desfecho da cena. e quando finalmente consegui me desvencilhar da situação, poderia ter se precipitado para a beirada da calçada aliviado e, afoito, me cumprimentado com longo abraço querendo saber o que tinha acontecido. eu teria contado, rindo, e mudaria de assunto rapidamente, como fosse aquela só mais umas das muitas aventuras da minha vida. poderíamos ter voltado ao bar, eu à minha mesa, ele para cumprimentar os muitos amigos. e depois voltaria, com cerveja na mão, para sentar-se ao meu lado, puxando novamente o assunto da polícia. então conversaríamos como em outros tempos, rindo muito e discordando em quase tudo, e uma discussão mais séria por algum assunto da política nacional poderia principiar, mas ambos, no esforço da paz, sorririam cúmplices e deixariam de lado a política, "só por hoje". então a noite passaria, e eu diria querer ir embora, e ele me ofereceria uma carona. eu aceitaria, e ainda no caminho para o carro, surpreendentemente, ele seguraria minha mão e me puxaria pra junto de si; e o beijo seria bom como foi antes, e ainda melhor pela surpresa de revisitar uma história que acabou. então iríamos para a casa de chão amarelo e travesseiro de camomila, tudo amarelo como o nome dele, que é escrito dessa cor na minha memória. e conversaríamos, e dessa vez eu não seria boba de dar respostas sem fazer perguntas, e ele me explicaria tudo, e eu entenderia, e explicaria os olhares, as cenas, todas as coisas pra mim inexplicáveis que aconteceram e acontecem. e pediria desculpas, e exigiria desculpas, e quereria saber de mim. e eu, que estou envolvida em coisas outras, ficaria confusa e surpresa, e falaria, e desconversaria. e provavelmente - aí sim - conseguiria esquecê-lo para sempre, como bem cabe a uma história que nunca foi o que poderia ter sido.

1 Comments:

Blogger malvinas said...

Eta!

Mais uma declaração de desamor... Tamo bem! Acho que é a minha vez

2:54 PM  

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