sexta-feira, agosto 03, 2007

Farewell

Eu ia mesmo te perguntar se você tinha certeza que queria tomar vinho. Dizem que só devemos bebê-lo quando temos a certeza de querer ir até o fim. Ele disse isso e me fitou docemente, com olhos de quem precisa mas ao mesmo tempo tem tudo sob controle. Não me arrependo, disse, e de tão aliviado ele suspirou.
A chuva caía barulhenta lá fora. Tirei os sapatos molhados e pedi um chá. Ele voltou com 4 tipos de ervas frescas na mão, enquanto eu lia a página de horóscopos no jornal. Acho que falava algo sobre viagens. Com a xícara na mão, o som das gotas no telhado, a vontade era de ficar calada. Havia entre nós uma intimidade ancestral que permitia o silêncio. Mas o encontro era de fato tão recente, que me fazia duvidar deste bem-estar inerente, que nunca foi construído.
Chorei um pouco. Um tanto para preencher o vazio, um tanto para mostrar que me importava. Hoje só podia estar chovendo. É. Você quer ler o que escrevi para você? Quero. Sentei na beira da cadeira vermelha, era bom ter a casa em silêncio. Li num fôlego. Que lindo era. Ele me olhou e disse: eu te amo. Tinha um jeito de dizê-lo que era só dele. Factual, mas intenso e desenvolto. Nada melado. Falamos de livros, de lustres, de lagartas. No carro, o manjericão ia deixar um cheiro forte. Preciso ir, saí de casa só para ir até a feira e ele deve estar me esperando. Que pena. Peguei os sapatos e saí descalça. Andamos juntos até a porta, o cordeiro atrás.O abraço foi terno e por pouco não virou beijo, como da última vez. Mas se houvesse o beijo, o silêncio seria ainda mais longo depois. Definitivo, quem sabe. Fui embora devagar, buscando o olhar dele, mas ele se fingiu absorto fazendo festinha na cabeça do cordeiro.